sexta-feira, 23 de novembro de 2012

Mudam-se os tempos, mas não as vontades



Apesar de não gostar de novelas de época, esta semana  vi um episódio da famosa novela "Gabriela". No decorrer daquele momento e, imbuida no espírito natalício, agradeci sinceramente ter nascido numa época em que posso fazer diversas escolhas para a minha vida, não direi com a liberdade total, uma vez que mesmo inconscientemente estamos muito condiciondos pelas normas sociais, mas com  autonomia quase tortal. Posso decidir onde vou, com quem vou, dispor do meu tempo da forma que considerar conveniente e prazeiroso. Posso decidir namorar ou casar com quem escolher. Sou soberana na decisão de participar em algo, ou de não participar. Sou ouvida na minha opinião e valorizada nas minhas opções. Gosto de ter a minha profissão e a minha independência. Sinto-me útil ao prestar um trabalho necessário à sociedade.

Ontem fui, como todos os mortais que precisam de se alimentar, ao supermercado. Gosto de ir ao supermercado a uma hora improvável para a maioria, à hora de jantar. Entrei e deparei-me com a tradicional campanha chamativa de brinquedos para o Natal. E como sempre gostei daquela sensação de escolher os presentes que iria ter no Natal fui ver os brinquedos das crianças nos dias de hoje. Para as meninas vi os tradicionais bonecos, no entanto agora vêm muito mais equipados do que no meu tempo. É carrinhos de passeio, banheiras, roupas e mais roupas, armários para guardar a roupa e adereços. Continuei pelo corredor e vejo, para muito espanto meu, máquinas de lavar roupa gigantes, frigoríficos enormes de duas portas, esfregonas e baldes industriais, aspiradores quase reais, vassouras e apanhadores, cozinhas com direito a fogão e exaustor, entre louças e muitas panelas. Eu ainda pensei que estava a viver um flashback do episódio da Gabriela. Então nós não mudámos de século? As mulheres continuam a ser educadas e formatadas para uma vida em que as tarefas domésticas assumem tempo significativo do seu dia-a-dia?

Não preciso dizer-vos que o corredor dos meninos continua com imensos carros, cada vez mais robustos e cheios de tecnologia, aviões, pistas de carros, jogos estimulantes e brincadeiras para fazer com os pares. E não, não olho para esta diferença como "natural" e como algo a que não devamos estar atentos. Estas meninas gostam de brincar com aquilo que identificam e podem relacionar com a sua mãe. E aqui é que está o grande problema. Desde pequenas que nos vamos moldando a esta função de cuidadoras e depois quando as mulheres casam e têm filhos deprimem. Acumulam tarefas, deixam de se arranjar, de fazer ginástica, de socializar. Anulam-se completamente e depois ainda têm os maridos a dizer que não gostam de sexo, que estão sempre mal-dispostas. É desde tenra idade que as meninas precisam que lhes digam que têm de fazer mais por si, de cuidar dos seus interesses, de aprender a ter paixão por um desporto ou por tocar um instrumento. É que as limpezas vão estar sempre lá, elas não fogem.



5 comentários:

S* disse...

Infelizmente as limpezas não se fazem sozinhas, mas cá em casa são partilhadas.

Sexinho disse...

Olá parei para fazer apenas este comentário; quando voltares a dar graças aos céus pela epoca em que nasceste não te esqueças também de agradecer pela geografia.
Não menos importante é o sitio onde se nasce. Estou na Arábia Saudita...

Unknown disse...

Gostei muito desse texto, também agradeço a época em que vivo e prezo mesmo muito a minha liberdade!
ainda no outro dia comentava isso com uns amigos, os brinquedos das meninas estão associados a tarefas domésticas...isso não muda!
beijo

Katie disse...

Gostei deste texto!!
Temos mesmo que agradecer a época em que nascemos!
ainda bem que lá em casa as limpezas são sempre divididas!
:-))

A Gaja disse...

S*: Não se fazem, infelizmente, mas no dia em que eu vir os meninos com este tipo de educação já não critico mais.

O sexo e a idade: Bem lembrado, esqueci-me desse fator. Agradeço imenso, nem me passa pela cabeça como essas mulheres aguentam. Boa sorte:)

katie: Dividias a sério? É que ainda não conheci nenhum homem que acordasse e dissesse: "ora vamos lá às limpezas, eu faço isto e aquilo". E que depois o faça na perfeição. Mas se tens isso, agradece, és uma mulher de sorte:)

Tralhas de mulher: Espero que lá para a época dos meus bisnetos já terá algo mudado um pouco que seja:)